Introdução
Em nosso último artigo, a parte 5 de nossa série, finalizamos o assunto sobre lógica clássica, de um aspecto mais geral, apresentando as regras de inferência e dedução natural para a lógica clássica de 1ª ordem; vimos também que o sistema da lógica de 1ª ordem é correto e completo, fazendo com que possamos trabalhar com ele sem nenhum tipo de problema interno.
Todavia, é chegada a hora de falarmos das lógicas posteriores à lógica clássica, as chamadas lógicas não-clássicas, dando um panorama sobre cada uma, bem como dar um esboço sobre o que motivou o surgimento delas.
Antes de mais nada, é bom relembrar a distinção que geralmente se faz entre as lógicas não-clássicas: ampliativas e desviantes. Uma lógica é de tipo ampliativo se conserva os princípios da lógica clássica, mas, talvez por considerá-la incompleta, acrescenta novos conceitos a ela. Uma lógica desviante, por sua vez, é aquela que tem a lógica clássica como incorreta em certo aspecto, e, assim, nega aquilo que considera errôneo.
Vamos ver um pouco sobre cada uma delas.
1. Lógicas ampliativas
As lógicas ampliativas caracterizam-se principalmente pelo uso das lógicas modais. Ora, existem diferentes modos que uma proposição pode se dar e cada lógica modal busca explorar um desses modos.
Por conta dessa diversidade de lógicas modais, criou-se também uma variedade de sistemas modais. Um sistema nada mais é do que um conjunto de axiomas junto de um conjunto de regras de inferência. Cada sistema tem diferentes axiomas e cada um lida com um tipo diferente de lógica modal. Veremos mais sobre isso ao falarmos sobre cada uma.
1.1. Lógica modal alética
Esta é o tipo de lógica modal mais antigo e também o mais famoso. Antes mesmo das grandes inovações da lógica no século XIX e XX, ela já era tratada — de maneira bem superficial — na antiguidade. Também é a lógica não-clássica que mais ocupa espaço nos manuais modernos, geralmente; e, quando se fala de lógica modal, ela é a primeira a vir à cabeça — as expressões são praticamente sinônimas. Enfim, do que trata a lógica modal alética?
“Alética” vem do grego, alethēia, e significa “verdade”. Então, como o nome sugere, este tipo de lógica trata das modalidades da verdade. Na semântica da lógica clássica dizemos apenas que uma proposição é verdadeira ou falsa {V, F}. A lógica modal, no entanto, amplia aquilo que podemos falar sobre o valor-verdade de uma proposição. Por exemplo:
(1) É possível que Ana vá ao mercado amanhã
Se fôssemos formalizar esta proposição com a lógica de 1ª ordem, diríamos apenas Ma, ou algo assim. No entanto, o que fazer com a parte da proposição que diz: “É possível que…”? Isto se perde completamente na formalização. Além disso, só nos resta afirmar que V ou que F de Ma. Ou então a seguinte frase:
(2) É necessário que todo gato é animal
Também não temos o que fazer com a parte que diz: “É necessário que…” dentro da lógica de 1ª ordem; mais uma vez, é uma informação da frase que se perde.
A lógica modal (alética) irá lidar justamente com esse tipo de conceito: possibilidade e necessidade. Quando algo é possivelmente verdadeiro, ou necessariamente verdadeiro, ou então impossível, ou ainda contingente. E a maneira de se fazer isso é bastante simples: iremos acrescentar novos operadores ao nosso alfabeto lógico:
- □, a necessidade; e
- ◊, a possibilidade.
Com esses novos operadores podemos formalizar de maneira apropriada as proposições enunciadas acima. A proposição (1) ficaria como:
◊Ma
que lido em linguagem natural seria: “é possível que Ana vá amanhã ao mercado”. O mesmo vale também para a nossa proposição (2) que, por ser uma relação de necessidade, ficaria da seguinte forma:
□(Ga⊃Aa)
Em outras palavras: “É necessário que, se a é um gato, então a é animal”.
Mas como determinamos se uma fórmula como essa é verdadeira ou falsa na lógica modal? Bem, nós o fazemos através da noção de mundos possíveis. Ao contrário do que o imaginário popular normalmente sugere, um mundo possível na lógica modal alética não tem nada a ver com multiversos ou realidades paralelas; na verdade, o termo é apenas uma metáfora para o seguinte:
- Um mundo possível é qualquer descrição consistente da realidade.
Ou seja, um mundo possível é qualquer descrição não contraditória da realidade (se não fosse assim, então estaríamos falando de mundos impossíveis). Usamos isso para falar de coisas que muitas vezes não são o caso, mas poderiam ser. Por exemplo:
(3) A Terra não existe
(4) O Sol é uma estrela azul
(5) Você não está lendo este texto
Todas essas são proposições falsas no “nosso mundo”, por assim dizer. Contudo, ninguém nega que elas poderiam ser verdadeiras. Se não fossem os milhões de anos de transformação, a Terra poderia não estar aqui agora; talvez por algum outro processo químico, o Sol poderia ter sido uma estrela azul (e na verdade é isso que se espera que vá acontecer num futuro longínquo) e você agora poderia estar fazendo qualquer outra coisa e não lendo este texto.
Falando nos termos da lógica modal, todas essas proposições são possíveis, ou, ainda, verdadeiras em algum mundo possível. O que significa que não implicam em qualquer tipo de contradição.
Agora, vejamos um outro grupo de proposições:
(6) Todo casado é um não solteiro
(7) Triângulos têm três lados
(8) Todo efeito tem causa
Poderiam estas proposições serem falsas em algum mundo possível? Vamos analisá-las… Ora, é contraditório dizer em (6) que há algum casado que seja solteiro, pois, se é casado, já não pode ser solteiro; o mesmo ocorre com (7), já que uma figura com mais ou menos de três lados não pode ser um triângulo; e o mesmo em (8), porque, se algo não tem causa, não temos como dizer que esse algo é efeito de outra coisa.
Como se pode ver, a negação de todas essas proposições implica numa contradição. Sendo assim, sua negação é impossível, ou seja, é falsa em todos os mundos possíveis. Bem, se a sua negação é sempre falsa, podemos concluir que a afirmação delas é sempre verdadeira, i.e., elas são necessárias, verdadeiras em todos os mundos possíveis.
E, no geral, é disso que trata a lógica modal alética. Ela surgiu justamente por essa impossibilidade (olha só) que a lógica clássica tem com a necessidade e a possibilidade.
1.2. Lógica temporal
Ela foi desenvolvida pelo lógico Arthur Prior nos anos 50. Também é um tipo de lógica modal, pois acrescenta um outro tipo de modalidade à lógica clássica; bem, como o próprio nome sugere, a modalidade aqui tratada é o tempo.
A noção de tempo na lógica clássica é totalmente desconsiderada. Não importa se algo já aconteceu, está acontecendo ou vai acontecer, ela simplesmente é verdadeira ou falsa. Contudo, a lógica temporal busca trazer uma expressividade maior para a nossa linguagem.
Ela faz isso trazendo consigo novos operadores para lidarmos com as noções temporais. São eles:
- P = “foi o caso que…”
- H = “sempre foi o caso que…”
- F = “será o caso que…”
- G = “sempre será o caso que…”
Se queremos dizer, por exemplo, que:
(1) Amanhã João irá o mercado e Maria irá trabalhar
podemos formalizar isso da seguinte maneira com lógica temporal:
F(Mj∧Tm)
Isto é: “será o caso que João irá ao mercado e Maria irá trabalhar”, é uma proposição acerca do futuro.
Os operadores da lógica temporal podem ser definidos um em função do outro — de maneira semelhante a como acontece com os operadores aléticos e com os quantificadores —, do seguinte modo:
Fα⇔¬G¬α
Pα⇔¬H¬α
Será o caso que α se e somente se não será sempre o caso que não-α; e foi o caso que α se e somente se não foi sempre o caso que não-α.
A lógica temporal funciona com um conceito análogo ao de mundos possíveis da lógica modal alética: os instantes. Nisso se baseia as suas condições de verdade:
- Gα é verdadeira em um instante t se e somente se α é verdadeira em todos os instantes posteriores a t;
- Hα é verdadeira em um instante t se e somente se α é verdadeira em todos os instantes anteriores a t;
- Fα é verdadeira em um instante t se e somente se α é verdadeira em algum instante posterior a t;
- Pα é verdadeira em um instante t se e somente se α é verdadeira em algum instante anterior a t;
As propriedades com que trabalha na lógica temporal podem mudar conforme o sistema em que estamos. O tempo pode ser tratado como sem começo nem fim; com começo, mas sem fim; como circular; como linear; e vários outros tipos. Tudo vai depender dos axiomas que temos no sistema.
Por exemplo, a proposição Gα⊃α. Ela nos diz que se α será sempre verdadeira, então já é verdadeira agora. Isso pode parecer estranho se estamos tratando o tempo de maneira linear; contudo, se o tempo for circular, então essa proposição é válida, pois o agora seria parte do futuro. Em outros sistemas, isso não valerá.
1.3. Lógica epistêmica
A lógica epistêmica foi desenvolvida em meados de 1912 por Clarence Irving Lewis, um lógico norte-americano, e passou pelas mãos de outros lógicos notáveis como Saul Kripke e Jaakko Hintikka. Como o nome já diz, a lógica epistêmica trata do conhecimento que um indivíduo ou grupo de indivíduos têm.
O operador fundamental desta lógica é o K, que quer dizer: “sabe-se que…” Se estivermos falando de mais de um indivíduo, então se acrescenta índices ao operador (K1, K2, K3, etc.). Deste modo, a fórmula “Kαϕ” se lê da seguinte maneira: “o indivíduo α sabe que ϕ”.
Além deste, podemos usar o operador E, que nos diz que todos os indivíduos de um determinado grupo sabem algo. Se, por exemplo, queremos dizer que “todos sabem que o céu é azul e as nuvens são brancas”, formalizamos como: E(Ac∧Bn), sendo A:= “x é azul” e B:= “x é branco”.
A semântica da lógica epistêmica também funciona a partir de mundos possíveis; contudo, uma explicação sobre ela demandaria um artigo único para isso. Portanto, não nos ocuparemos com ela aqui.
Uma lógica parecida com a epistêmica é a lógica doxástica. O nome vem do grego, doxa, que quer dizer “crença”. O operador de crença é o B, que significa: “acredita-se que…” Por exemplo, se digo que “acredita-se que Deus existe”, então formalizo está proposição como: B(∃xDx), isto é, acredita-se que existe um x tal que x é Deus.
1.4. Lógica deôntica
Deôntica está relacionado aos deveres. A lógica deôntica é aquela que trabalha com as noções de obrigação, permissão e proibição. Seus operadores são: O, P e Ph, respectivamente. Se quero dizer que “é proíbido fumar”, então formalizo como Ph(∀xFx), é proibido para todo x que x fume.
Uma parte interessante da lógica deôntica é que os axiomas na forma de □α⊃α não são válidos para ela, como na lógica alética, epistêmica ou temporal (nos casos em que o tempo é circular). Pois, se assim fosse, a fórmula Oα⊃α — se α é obrigatória, então α é cumprida — seria válida, o que obviamente não pode ser o caso. Portanto, os sistemas deônticos descartam essa fórmula como axioma. O sistema modal que trata da lógica deôntica é o sistema D, que tem como axioma a fórmula Oα⊃Pα, isto é, se é obrigatório que α, então é permitido que α.
2. Lógicas desviantes
Ao contrário do que já vimos, as lógicas desviantes negam conceitos da lógica clássica, geralmente aqueles três mais principais como a Lei de Terceiro Excluído ou então o Princípio de Não-contradição. Isso por considerarem que estes princípios trazem problemas insolúveis ou, simplesmente, por não serem adequados.
Vejamos agora algumas lógicas desviantes.
2.1. Lógicas polivalentes
Um dos princípios centrais da lógica clássica é o princípio de bivalência: uma proposição é verdadeira ou é falsa, sem meio termo. Contudo, existem certos sistemas que contestam isso e disso surgem as lógicas trivalentes.
As mais importantes de se nomear são a lógica do polonês Jan Łukasiewicz, famoso por sua notação própria e pela formalização da silogística aristotélica, e os sistemas de Stephen Kleene. O que motivou estes e outros lógicos foi um problema já bastante antigo acerca das proposições que falam sobre o futuro. A suspeita era de que se uma frase futura fosse realmente verdadeira ou falsa, então o livre-arbitrio humano estaria comprometido e haveria um determinismo.
O raciocínio é bem simples: digamos, por exemplo, que “Saul Kripke passará o natal no Brasil”. Agora, suponhamos que essa proposição seja verdadeira. Ela sendo verdadeira, então, parece que não importa o que Saul Kripke faça, ele passará o Natal no Brasil, não importa o que ocorra. Se ela for falsa, no entanto, o problema permanece, pois, assim, seria impossível que Saul Kripke passasse o natal no Brasil nem mesmo se quisesse tal coisa.
Além disso, havia também o Paradoxo do Mentiroso que também motivava alguns há abandonar o princípio de bivalência, que consiste basicamente em dizer que há um terceiro valor-verdade que não é nem verdadeiro nem falso, mas indeterminado. Essa indeterminação, como argumentam, não é epistêmica, mas ontológica. Ou seja, de fato uma proposição pode ser indeterminada.
É fácil ver a partir disso que ϕ∨¬ϕ não é válida nos sistemas trivalentes, já que, uma vez que ϕ é indeterminada, então ¬ϕ também será. Como uma fórmula válida é aquela que é sempre verdadeira, ϕ∨¬ϕ não é válida.
A lógica de Kleene vai um pouco além, visto que simplesmente não existem fórmulas válidas no seu sistema e o terceiro valor de seu sistema não é indeterminado, mas sim de (matematicamente) indecídivel.
Depois disso vieram as lógicas tretavalentes, com quatro valores de verdade, e, por fim, alcançou seu ápice com a lógica difusa que possui, literalmente, infinitos valores de verdade. Esses valores são representados por números e oscilam entre os valores de {0, 1}. Uma proposição na lógica difusa por ser 0,45 verdadeira, por exemplo. Por conta disso, esta lógica acabou recebendo uma interpretação mais probabilística, onde 0,5 de verdade, por exemplo, quer dizer apenas que a proposição é verdadeira com uma probabilidade de 50%. Hoje em dia os seus maiores usos são na computação.
2.2. Lógicas paraconsistentes
As lógicas paraconsistentes são aquelas que negam, em certo sentido, o princípio de não-contradição ou o principio da explosão. Foi idealizada por vários autores, entre eles os mais eminentes foram Newton da Costa e Graham Priest. Embora sejam ambos lógicos paraconsistentes, suas visões acerca disso são um tanto quanto opostas.
Começando por Da Costa, o seu objetivo era idealizar um sistema em que se pudesse pensar de maneira incosistente moderadamente. Algo que nos ajudasse a pensar com situações em que nossas tomadas de decisões são contraditórias ou quando temos uma contradição, mas podem tirar disso algo não-trivial. Em outras palavras, ele queria burlar o princípio da explosão (ou Lei de Duns Scot) que afirma ser possível derivar qualquer outra proposição de uma proposição falsa (geralmente contradições).
Já Priest tinha uma visão mais exagerada das contradições. Para ele, as contradições existem de fato e são reais e a prova disso, supostamente, são paradoxos com os do Mentiroso ou o paradoxo de Russell. Sendo assim, ele fundou o que se conhece por dialeteísmo, uma visão realista das contradições.
E claro, há vários outros sistemas paraconsistentes, mas que não valem ser citados aqui.
2.3. Lógica de relevância
A lógica de relevância é um tanto confusa em sua classificação. Por um lado, ela adiciona operadores modais a sua linguagem; por outro, ela nega alguns conceitos importantes da lógica clássica. Como ela é geralmente tomada como desviante, optei por fazer o mesmo aqui.
A lógica de relevância também é paraconsistente e logo entederemos por que, mas é especial se comparada às demais, pois o seu foco não está em negar as contradições. O que Clarice Irving Lewis, criador da lógica de relevância, queria fazer era resolver os Paradoxos da Implicação Material.
Basicamente, os tais “paradoxos” surgem de uma noção contra-intuitiva de como lemos a Implicação material, na forma “se… então”. A proposição p⊃(q⊃p) diz que: “se p, então se, qualquer que seja, q, então p”. Outro exemplo seria (p∧¬p)⊃q, ou seja, se o antecedente é uma contradição, então ele implica qualquer outra proposição.
Transmitindo isso para a linguagem natural, teriamos que enunciados como: “Se é dia e não é dia, então o Papai Noel existe”, ou “Se 1+1=3, então, se o céu é verde, 1+1=3”, ou ainda “Se unicórnios existem, então a lua é feita de queijo” e qualquer coisa desse gênero seria, segundo a semântica da implicação, um enunciado verdadeiro.
Lewis viu problema nisso e decidiu acrescentar à lógica o conceito de Implicação estrita, um modo mais específico, por assim dizer, de lidar com a Implicação. Seja (⇒) o nosso símbolo de Implicação estrita, temos que:
(p⇒q) sse □(p⊃q)
A leitura é como se segue: “p implica estritamente em q se e somente se é necessário que p implique materialmente em q”. Em outras palavras, p deve implicar que q em todos os mundos possíveis. Uma proposição como, por exemplo: “Se Beethoven era americano, então o Brasil não existe” será simplesmente falsa na lógica de relevância, pois é fácil imaginar um mundo possível tal que Beethoven é americano, mas o Brasil ainda existe.
Já outras proposições como: “Se a Terra é redonda, então não é o caso que a Terra não é redonda” são uma Implicação estrita, pois, nesse caso em específico, a sua negação implica uma contradição; como contradições são impossíveis, isto é, falsas em todos os mundos possíveis, a proposição em questão é necessária. Sendo assim, podemos dizer que o antecedente implica estritamente o consequente.
Contudo, nem tudo são flores para Lewis. Descobriu-se que a própria lógica relevante tinha os seus “paradoxos”, como as seguintes proposições:
(1) □α⇒(β⇒α)
(2) ¬◊α⇒(α⇒β)
Traduzindo: (1) uma proposição necessário pode ser implicada estritamente por qualquer outra; e (2) nos diz que uma proposição impossível implica qualquer outra. Lewis estava ciente desses problemas, mas não os considerou relevantes, pois a implicação pode ser lida como o inverso da dedutibilidade. Ora, dizer que α implica β é o mesmo que dizer que β é dedutível de α e, assim, não teria problema dizer que algo impossível deduz qualquer coisa.
Entretanto, outros lógicos relevantes discordaram de Lewis e decidiram mudar o conceito de dedutibilidade da lógica clássica, crendo ser este o problema. Assim, introduziram índices nas fórmulas, impedindo com que a regra de (RPC) fosse usada sobre qualquer proposição. A regra é simples: a (RPC) só pode ser usada quando o índice do antecedente está contido no índice do consequente. Por exemplo, provemos que (p⊃q)⊃(¬q⊃¬p):
- |p⊃q{1} hipótese
- ||¬q{2} hipótese
- ||¬p{1,2} 1,2, M.T.
- |¬q⊃¬p{1} 2-3, RPC
- .·. (p⊃q)⊃(¬q⊃¬p) 1-4, RPC
Como pode-se notar, cada nova premissa ou hipótese nova introduzida (no caso, apenas hipóteses) recebe um índice novo. Quando fazemos uma inferência — como na linha (3) a partir de (1) e (2) — o resultado do índice é a união das hipóteses usadas na dedução — {1,2} — e quando usamos a RPC — nas linhas (2) a (3) e (1) a (4) — vemos que o índice do antecedente está contido no consequente e o resultado final do índice é a diferença entre os conjuntos anteriores.
É aí que entra o caráter paraconsistente da lógica de relevância, já que é possível ter sistemas que possuem contradições, mas que não são triviais, isto é, não deduzem qualquer coisa a partir disso. Sendo assim, a lógica de relevância por um lado nega o princípio de não-contradição e explosão da lógica clássica, todavia também a acrescenta com os operadores modais. Ela é uma lógica “híbrida”, por assim dizer.
2.4. Lógica intuicionista
Foi desenvolvida pelo matemático intuicionista L. E. J. Brouwer, que era distinto dos matemáticos clássicos. Para Brouwer e os intuicionistas, os objetos matemáticos são puramente mentais, não existem fora da mente humana. Um intuicionista considera a existência de um objeto matemático apenas quando há alguma forma de contruí-lo. Por exemplo, é fácil demonstrar que há um número primo maior do que 100. Basta ir conferindo número a número após 100 para logo encontrar o número 139, por exemplo.
Por conta disso, o método de prova por reductio ad absurdum, para um intuicionista, não é válido, pois não nos oferece um método de construção do objeto. O mesmo vale para a regra de dupla negação, de que ¬¬p⊃p. (Uma das parte mais curiosas — e até engraçadas — de tudo isso é que o contrário disso é válido; ou seja, p⊃¬¬p é intuicionisticamente válido).
Outra parte peculiar dos intuicionistas é que, diferente de quase todos os demais lógicos, para eles, a lógica não deve ser aplicada a toda e qualquer disciplina, mas se resume apenas aos esquemas matemáticos. Sendo assim, a matemática seria de um patamar superior e mais fundamental em relação à lógica e não o contrário como normalmente se pensa.
Dito isso, o ponto alto das peculiaridades da lógica intuicionista é a sua rejeição ao princípio de terceiro excluído. Na semantica intuicionista, verdade é sinônimo de provabilidade. E como há problemas matemáticos insolúveis, isto é, que não podemos criar um modelo de construção nem para α nem ¬α, o princípio não pode ser válido intuicionisticamente.
Além disso, os operadores aqui não são funções de verdade, mas apenas simbolizam os modelos de contrução de uma prova matemática. Por exemplo, p∧q diz que existe algo que seja construção de p e algo que seja contrução de q.
Certamente é uma lógica bem diferente das convencionais.
Conclusão
Demos um breve passeio em cada uma das lógicas não-clássicas mais famosas. Claro, existem infinitas outras, a lógica nunca para de mudar e mais mentes trabalham no seu aperfeiçoamento. Podemos ter certeza de que a lógica é um campo bastante vasto e, quanto mais nos aprofundamos, mais interessante fica. Ela é intrigante e bela à sua maneira. É algo que vale a pena ser conhecido.
Uma resposta em “Lógica: uma introdução — parte 6”
Uma visita satisfatoria, superou minhas expectativas, voltarei
em breve..! Bom Trabalho..!